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20-01-2024 

O prazo de 90 dias para encerramento da AGC que vota o plano de recuperação judicial

Ao reformar a Lei nº 11.101/2005, que regula os procedimentos judicial e extrajudicial de recuperação de empresas e falência, o legislador incluiu, por meio da Lei nº 14.112/2020, um parágrafo 9º no artigo 56, determinando que a Assembleia Geral de Credores (AGC) convocada para deliberar sobre o plano de recuperação judicial deverá ser encerrada em até 90 dias contados da data de sua instalação:

“Art. 56. (…)

9º. Na hipótese de suspensão da assembleia-geral de credores convocada para fins de votação do plano de recuperação judicial, a assembleia deverá ser encerrada no prazo de até 90 (noventa) dias, contado da data de sua instalação.”

 

Na falta de indicação de uma consequência na própria norma, doutrina e jurisprudência têm, aos poucos, seguido a linha de permitir a flexibilização do referido prazo, especialmente a partir de deliberação da própria Assembleia Geral de Credores.

Com o devido respeito, esse entendimento não nos parece o mais adequado.

De início, há que se levar em consideração que o legislador foi direto na redação, incluindo a locução imperativa “deverá” que, por si só, implica uma obrigação.

Mas não só.

É muito esclarecedor, no tema, o Relatório Legislativo produzido no Senado Federal, assinado por seu presidente, senador Rodrigo Pacheco, quando da tramitação e aprovação do Projeto de Lei nº 4.458, de 2020, que deu origem à Lei nº 14.112/2020 [1].

Como narrado no relatório, no curso de sua tramitação, o projeto de lei recebeu a Proposta de Emenda nº 57, em que se pretendia atribuir aos credores o direito de autorizar a prorrogação da Assembleia Geral de Credores por prazo superior a 90 dias.

Essa possibilidade foi, contudo, rejeitada pelo legislador.

É o que se vê no trecho do relatório abaixo transcrito:

“A quinquagésima-sétima Emenda permite que os credores autorizem a prorrogação da AGC por prazo superior a 90 dias, ignorando que o Projeto já permite isso através da possibilidade de PRJ pelos credores, e ignorando que a prorrogação ad eternum da recuperação judicial acaba, na prática, por afetar direitos também de credores extraconcursais, que não participarão dessa deliberação pela prorrogação. Deve ser rejeitada.”

Assim, uma vez que essa possibilidade não consta do texto legal e foi rejeitada pelo legislador no curso da tramitação do projeto de lei, nos parece claro que os credores não têm poder de autorizar a extensão da Assembleia Geral de Credores além do prazo de 90 dias previsto pelo parágrafo 9º do artigo 56 da Lei nº 11.101/2005.

De igual modo, também não vislumbramos fundamentos que permitam ao juízo recuperacional flexibilizar o referido prazo.

Primeiro, porque a lei não prevê essa possibilidade, pelo contrário. A observância do prazo de 90 dias é introduzida por uma locução imperativa.

A Lei nº 14.112/2020 diferenciou o regime jurídico do prazo previsto para encerramento da Assembleia Geral de Credores, de caráter peremptório, daquele relativo ao stay period — referido, com frequência, para justificar a extensão do prazo sob o argumento de analogia —, para o qual foi prevista expressamente a possibilidade de prorrogação, conforme alteração do artigo 6º, §4º, da Lei nº 11.101/2005.

A bem da verdade, o parágrafo 9º do artigo 56 tem a mesma natureza do artigo 53 da Lei nº 11.101/2005 [2], que obriga o devedor a apresentar, em até 60 dias contados da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, seu plano de reestruturação.

Ora, tão relevante quanto apresentar o plano de recuperação judicial é sua deliberação pelos credores, a fim de que seja decidido de forma eficiente e expedita, por aqueles que titulam créditos contra a devedora, se essa ostenta condições de manter suas atividades e, em caso positivo, de que forma se dará o prosseguimento do negócio.

Não há sentido sistêmico, razoável e proporcional para o prazo de apresentação do plano de recuperação judicial ser peremptório e aquele para realização da Assembleia Geral de Credores, que o delibera, não o ser.

Os fundamentos usados para rejeitar a Proposta de Emenda nº 57, constantes do Relatório Legislativo do Senado, revelam que o propósito da reforma era estipular um prazo que garantisse a resolução célere da situação da recuperanda, ainda que pela reprovação das condições propostas. Evitando assim as já conhecidas excessivas e reiteradas prorrogações a que se submetem essas deliberações, em meio a um cenário de incerteza para os credores e fruição pela recuperanda dos benefícios legais dessa condição.

Em respeito ao devido processo legislativo, portanto, e com fulcro na interpretação teleológica, o “deverá” tem que ser lido como “dever”, sem possibilidade de tergiversação.

E qual seria, então, a consequência de inobservância à norma do parágrafo 9º do artigo 56 da Lei nº 11.101/2005?

A decretação de falência.

Com a inclusão do parágrafo 9º no artigo 56, criou-se mais uma obrigação para as empresas que pretendem fazer jus aos inúmeros benefícios da recuperação judicial, cujo alcance não depende mais da mera aprovação do plano – a qualquer tempo –, mas de sua aprovação no prazo de até 90 dias do início das deliberações.

Não se pode, sob os mantos de preservação da empresa e de função social, permitir que o favor legal, que é exceção, seja maximizado de forma não prevista em lei.

É natural que a tutela do Estado para descumprir obrigações com terceiros de boa-fé seja acompanhada de contrapartidas relevantes e de observação mandatória.

Ainda que se entenda o rol do artigo 73 da Lei nº 11.101/2005 como taxativo, a não deliberação do plano de recuperação judicial no prazo máximo (peremptório) previsto pelo legislador pode ser equiparada à sua não aprovação, motivando, assim, a declaração de falência com fundamento o artigo 73, III da Lei nº 11.101/2005 [3].

Essa interpretação, a nosso ver, atende ao propósito da norma, evitando-se que, contrariamente à pretensão do legislador, se transforme seu comando em letra morta.

 

[1] Disponível no seguinte link: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8908541&ts=1630436936840&disposition=inline&_gl=1*52ujk0*_ga*ODUzNTM4MjA0LjE3MDUwMDQwMTI.*_ga_CW3ZH25XMK*MTcwNTMyNzM0NC4yLjAuMTcwNTMyNzM0NC4wLjAuMA.

[2] Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter (…).

[3] Art. 73. O juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial:

(…)

III – quando não aplicado o disposto nos §§ 4º, 5º e 6º do art. 56 desta Lei, ou rejeitado o plano de recuperação judicial proposto pelos credores, nos termos do § 7º do art. 56 e do art. 58-A desta Lei;

 

Fonte: Conjur.

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