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22-03-2021 

Novas regras trazem muitos avanços para a recuperação judicial

Em 23 de janeiro de 2021, entrou em vigor a Lei 14.112/2020, que reformulou a Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005), bem como promoveu mudanças de extrema relevância na legislação tributária federal para empresas que necessitam do favor legal da recuperação judicial.

Sem sombra de dúvidas, uma das maiores dificuldades de uma empresa em recuperação judicial são os seus débitos tributários, razão pela qual a Lei 14.112/2020 tratou de criar novos instrumentos para resolução do passivo fiscal, com alterações na sistemática do parcelamento, possibilidade de negociação dos débitos inscritos em dívida, além de prever aproveitamento do prejuízo fiscal.

Merece destaque a alteração promovida no artigo 10-A da Lei 10.522/2002 para permitir ao empresário ou à sociedade empresarial, que ajuizou ou teve deferido o seu pedido de recuperação judicial, parcelar todos os seus débitos com a fazenda nacional em até 120 prestações mensais.

Podem integrar essa negociação todos os débitos existentes com a Fazenda Nacional, ainda que não vencidos até a data do pedido de recuperação judicial, de natureza tributária ou não tributária, que podem estar inscritos ou não em dívida ativa.

Trata-se de importante inovação, pois a legislação anterior previa o parcelamento em no máximo 84 parcelas, sendo, portanto, bastante razoável e vantajosa essa extensão do prazo em 36 meses, principalmente para uma empresa em recuperação judicial, que além de suas obrigações diárias ainda precisa honrar outros compromissos do plano com seus credores, e continuar a gerar receita para manter a sua atividade econômica.

Um outro aspecto interessante a destacar é a possibilidade de liquidação de até 30% da dívida consolidada no parcelamento com a utilização de créditos decorrentes do prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL), ou com outros créditos próprios relativos a tributos administrados pela Receita Federal. Contudo, nessa hipótese, o saldo remanescente da dívida só poderá ser parcelado em no máximo 84 parcelas (artigo10-A, inciso VI da Lei 10.522/2002).

Isso implica na possibilidade de redução da dívida utilizando o próprio prejuízo fiscal, que no caso das empresas em recuperação judicial são bastante expressivos, e ainda assim ter um prazo expressivo para parcelamento do restante.

Quanto às condições impostas para o parcelamento, a lei exigiu a celebração de um termo de compromisso (§2º-A do artigo 10-A Lei 10.522/2002), no qual estará previsto:

a) O fornecimento à Receita Federal e à procuradora-Geral da Fazenda Nacional de todas as informações bancárias, inclusive aplicações, e eventual comprometimento de recebíveis e demais ativos futuros;

b) A obrigação de amortizar o saldo devedor do parcelamento, com percentual do produto de cada alienação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante realizada durante o período de vigência do plano de recuperação judicial, observado o limite máximo de 30% do produto da alienação;

c) Manter a regularidade fiscal e o pagamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);

d) O oferecimento de garantia idônea e suficiente, aceita pela Fazenda Nacional em juízo, ficando consignado que essa garantia não poderá ser incluída no plano de recuperação judicial, sendo permitida sua execução, inclusive por meio de expropriação, em caso de descumprimento do parcelamento.

Conforme denota-se, apesar da Lei 14.112/2020 ter procurado conceder um fôlego a mais para a empresa em recuperação judicial pagar os seus débitos tributários, se exigiu do devedor contrapartidas que, a depender do caso, podem comprometer a própria operacionalização do plano de recuperação, como a obrigatoriedade de destinação de parte dos recursos das vendas das unidades produtivas isoladas (UPIs) para amortizar o parcelamento, e o oferecimento de garantia suficiente para saldar a dívida tributária que não pode ser incluída no plano.

Acresça-se que, em caso de descumprimento do parcelamento, além de ser iniciada de imediato a excussão da garantia, a Lei 14.112/20 ainda autorizou o Fisco a pedir a falência da recuperanda, dispositivo bastante polêmico cuja validade será discutida nos tribunais.

Um outro ponto que também merece ser enaltecido é a alteração realizada pelo artigo 10-B da Lei 10.522/2002, que inovou ao autorizar o parcelamento de débitos de tributos retidos na fonte ("apropriação") e também do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) já existentes, sendo permitido o parcelamento desses débitos, inscritos ou não em dívida ativa, em até 24 parcelas mensais.

Embora em um primeiro momento possa não parecer razoável essa alteração, principalmente se for questionado o limite máximo das parcelas, trata-se de importante evolução, pois quanto aos referidos débitos fiscais, até a entrada em vigor da Lei 14.112/20, era vedada qualquer concessão de parcelamento, consoante previsão expressa do artigo 14 da Lei 10.522/2002, além do que a apropriação de tributos retidos, que deveriam ser repassados ao Fisco, tem natureza penal, e essa solução pode evitar graves dissabores ao empresário.

Ainda, outra alteração que merece registro é a possibilidade de empresas ou empresários com o processamento do pedido de recuperação judicial já deferido, de forma alternativa, poderem submeter à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) proposta de transação de créditos inscritos em dívida ativa da União, nos termos da Lei nº 13.988/2020, podendo nesses casos serem abrangidos os créditos das autarquias e fundações públicas federais (artigo10-C da lei 10.522/2002).

Nesse caso, a lei deixou bem claro (inciso III do artigo 10-C) que a análise da proposta do devedor é de exclusividade da PGFN, que decidirá através de ato discricionário, desde que obedecidas algumas regras da matéria e da própria Administração Pública, como: motivação, interesse público, isonomia, capacidade contributiva, transparência, moralidade, livre concorrência, preservação da atividade empresarial, a razoável duração do processo e a eficiência.

Nesse caso, a Lei 14.112/20 também permitiu o parcelamento da dívida em até 120 prestações mensais, e ainda foi além ao permitir a possibilidade de se estender o prazo por mais 12 meses, quando comprovado que o devedor em recuperação judicial desenvolve projetos sociais (§1º do artigo 10-C da lei 10.522/2002).

Por fim, não se poderia encerrar esse estudo sem se fazer uma alusão aos artigos 6º-B e 50-A da Lei 11.101/2005, que sem dúvida contribuiriam para o soerguimento da empresa em recuperação judicial, mas que infelizmente foram vetados pelo presidente da República, estando os vetos pendentes de revisão pelo Congresso Nacional (artigo 66, §44 CF).

Com relação ao artigo 6-B, que foi vetado, esse dispositivo afastava a conhecida trava de 30% para permitir que o ganho de capital resultante da alienação judicial de bens e direitos da empresa em recuperação judicial pudesse ser abatido dos prejuízos fiscais e base de cálculo da CSLL de forma ilimitada. O veto presidencial ainda será analisado pelo Congresso Nacional.

Em linhas gerais, isso implicaria em mais recursos injetados na empresa, que poderia utilizar a integralidade do ganho de capital para sua revitalização, e com isso fortalecer o seu combalido fluxo de caixa.

No tocante ao também vetado artigo 50-A, esse dispositivo possibilitava a compensação do ganho obtido pelo devedor no perdão de parte da sua dívida com os credores (deságio), com prejuízos fiscais de forma ilimitada, também sem a trava de 30% na apuração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da CSLL. Também esse veto será apreciado pelo Legislativo.

A verdade é que a cobrança sobre o deságio sempre foi um verdadeiro contrassenso com os objetivos da recuperação judicial, pois, nesse caso, o credor, que seria o principal interessado, não recebeu uma parte da dívida, e o Fisco, mesmo assim, cobra a parte que lhe caberia como se esta fosse integralmente quitada.

O fato é que as empresas em recuperação judicial geralmente possuem saldo relevante de prejuízos fiscais acumulados de exercícios anteriores, sendo forçoso convir que a limitação na utilização desses recursos, principalmente sobre o ganho obtido pela recuperanda com a redução da dívida, não contribui para o soerguimento da empresa, bem ao contrário.

Por esses motivos, seria de extrema relevância para garantia de efetividade da recuperação judicial que o veto a esses dois dispositivos fosse revisto, pois, da forma em que ficou estabelecido na lei, 70% de qualquer ganho auferido pela recuperanda, seja com a alienação dos ativos, ou com a redução da sua dívida, acaba sendo tributado por Imposto de Renda e CSLL, ainda que o saldo de prejuízo fiscal seja suficiente para compensar o ganho, o que faz com que a limitação imposta pela lei não tenha qualquer coerência com o princípio da preservação das empresa em recuperação (artigo 47 da lei 11.101/2005), cuja sobrevivência interessa à sociedade, eis que é fonte geradores de empregos, impostos e riquezas.

Embora a legislação tributária aplicada aos processos de recuperação ainda tenha muito o que evoluir, não se pode olvidar que a Lei 14.112/2005 trouxe importantes avanços para a matéria, sendo notório que estas modificações contribuirão para que a Lei 11.101/2005 cumpra o seu real objetivo, que é o da preservação dos benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial.

Fonte: ConJur

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