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26-11-2023 

Dívidas do agronegócio que podem ser renegociadas na recuperação judicial

A recuperação judicial é um instrumento legal que possibilita a negociação de dívidas por empresas em crise financeira, permitindo que elas sejam reorganizadas, sob os aspectos socioeconômicos e internos, objetivando o soerguimento e a continuidade de desenvolvimento.

A Lei nº 11.101/05, conhecida como Lei de Recuperação Judicial e Falências, embora não trate especificamente da renegociação de dívidas do setor do agronegócio, pode ser aplicada em empresas rurais que estejam enfrentando dificuldades financeiras e buscando reestruturação empresarial.

O ápice da integração dos produtores rurais no âmbito da recuperação judicial ocorreu com a promulgação da Lei nº 14.112/20. Anteriormente, o êxito desse procedimento aos produtores rurais era condicionado ao entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça), mas com a reforma da Lei nº 11.101/2005 trazida pela nova legislação, a viabilidade da utilização da recuperação judicial por esses agentes econômicos, cruciais para a economia do país, passou a ser assegurada por lei. Essa inclusão abrange a renegociação de dívidas decorrentes de empréstimos bancários, financiamentos agrícolas, dívidas com fornecedores, e outros compromissos financeiros das empresas rurais. No entanto, é crucial destacar que a lei estabelece limites e condições para a inclusão de dívidas nesse processo de renegociação.

Nesse cenário, surge uma nova realidade para os produtores rurais que buscam se reerguer no mercado por meio da recuperação judicial. A Lei nº 14.112/20 introduziu novas restrições aos créditos decorrentes da atividade agrícola aptos a serem renegociados durante o processo de recuperação. Em outras palavras, nem todos os créditos ligados à atividade rural estão sujeitos à recuperação judicial.

É importante esclarecer que, ao se afirmar que um crédito está submetido ao processo de recuperação judicial, significa que o detentor desse direito creditório só pode renegociar a dívida dentro dos limites estabelecidos pelo plano de recuperação judicial a ser proposto no procedimento legal. Por outro lado, se um crédito está fora da recuperação judicial, o credor mantém o direito de buscar a satisfação desse crédito de forma autônoma, utilizando medidas constritivas como execução forçada, excussão extrajudicial de garantias, entre outras.

É necessário ressaltar, porém, que todas as medidas constritivas contra empresas em recuperação judicial devem ser submetidas ao juízo responsável pelo processo, garantindo assim os direitos dos credores concursais e a continuidade das atividades da empresa em recuperação, conforme estabelece o artigo 6º, §7-A da Lei nº 11.101/05.

Dentre as mudanças significativas trazidas pela Lei nº 14.112/20 para o processo de recuperação judicial do produtor rural, destacam-se as alterações nos parágrafos 6º a 9º do artigo 49 da Lei. Estes parágrafos estabelecem parâmetros específicos para produtores rurais, limitando os créditos que podem ser a ele submetidos.

A Lei excluiu para o processo de recuperação judicial de produtores rurais, os seguintes tipos de créditos:

Cédula de Produto Rural com liquidação física [1]: As obrigações vinculadas à CPR não são suspensas pela recuperação judicial, permitindo que o credor force o cumprimento da entrega da safra quando a liquidação do título for em produto.

Créditos não relacionados com a atividade rural ou não escriturados na contabilidade [2]: Somente os créditos exclusivamente decorrentes da atividade rural e devidamente documentados na contabilidade poderão ser incluídos no processo de recuperação.

Créditos renegociados antes do pedido de recuperação judicial [3]: Qualquer crédito rural renegociado antes do pedido de recuperação não está sujeito à recuperação judicial. A Lei nº 4.829/1965, que trata do fomento à atividade rural, é referenciada nesse contexto.

Créditos decorrentes de aquisição de propriedade rural nos 3 anos anteriores ao pedido [4]: Dívidas contraídas para aquisição de propriedades rurais nos três anos anteriores ao pedido de recuperação judicial não estão incluídas no processo.

Além dessas exclusões específicas para a atividade rural, os produtores rurais que buscam a recuperação judicial devem atentar para os créditos não submetidos dentro da regra geral da Lei nº 11.101/2005, conforme estabelecido nos seus artigos 49, §3 e 86, II [5]. Dentre esses, destacam-se:

Credor titular de garantia fiduciária de bem móvel ou imóvel: O direito do credor é mantido inalterado se o devedor está na posse, mas ainda não adquiriu a propriedade do bem. No entanto, o credor não pode retirar bens essenciais à atividade da empresa recuperanda durante o stay período, período esse de 180 dias após a decisão de processamento da recuperação, podendo ser prorrogado por mais 180 dias.

Proprietário em contrato de venda com reserva de domínio: Contratos de compra e venda com reserva de domínio não são abrangidos pela recuperação judicial, desde que ele esteja contemplado pela cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade.

Proprietário ou promitente vendedor de imóveis: O credor dos contratos de compra e venda de imóveis ou promessa de compra e venda não está sujeito à recuperação judicial, desde que os contratos estejam contemplados pela cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade.

Adiantamento de Contrato de Câmbio para Exportação: Créditos referentes a adiantamento de contrato de câmbio para exportação não são abrangidos pela recuperação judicial. Esse tipo de contrato envolve o pagamento antecipado em moeda nacional antes do recebimento da moeda estrangeira, comum em transações de exportação.

Em síntese, a recuperação judicial para produtores rurais implica considerar as restrições impostas pela legislação vigente, tanto em relação aos tipos de créditos que podem ser renegociados quanto às condições e limites estabelecidos. Essas peculiaridades refletem a preocupação em equilibrar a proteção dos interesses dos credores e manutenção da empresa.

Conclusão
A Lei nº 14.112/20, ao estabelecer exclusões específicas para a recuperação judicial dos produtores rurais, introduziu consideráveis limitações que merecem escrutínio. O objetivo inicial da recuperação judicial é proporcionar uma oportunidade de reorganização para empresas em crise financeira, impedindo a falência e preservando os empregos e as atividades econômicas. Contudo, as restrições impostas pela nova legislação, principalmente nos parágrafos 6º a 9º do artigo 49, revelam uma abordagem excessivamente seletiva, comprometendo a eficácia desse instrumento para um setor tão essencial para o desenvolvimento nacional, como é o agropecuário.

A introdução de segregações de créditos decorrentes da atividade agrícola cria um cenário complexo e fragmentado, onde nem todos os créditos vinculados à atividade rural podem ser contemplados pela recuperação judicial. Essa abordagem contrapõe a ideia fundamental de reestruturação, prejudicando a capacidade dos produtores rurais de superar dificuldades financeiras e manter suas operações de forma sustentável.

Adicionalmente, as exclusões específicas para produtores rurais, tanto pessoas físicas quanto jurídicas, apresentam um contrassenso em relação à máxima legislativa estabelecida em outras legislações vigentes para esse mesmo segmento de atividade[6]. A amplitude original da Lei nº 11.101/05, que restringia em menor proporção a submissão dos créditos na recuperação judicial, é agora mitigada por parâmetros mais restritivos para o setor do agronegócio. Isso sugere que, para os produtores rurais, a lei pode não ser tão benéfica quanto para outros segmentos econômicos, criando desigualdades na aplicação do instrumento e cria um concurso de credores que tramitará paralelamente à recuperação judicial.

Diante dessas considerações, torna-se crucial uma revisão aprofundada dessas exclusões, visando preservar o propósito essencial da recuperação judicial e garantir que as sociedades empresárias rurais e os produtores rurais possam usufruir plenamente desse mecanismo legal para reverter cenários adversos. A busca por um equilíbrio entre a proteção dos credores e a viabilização da recuperação das empresas rurais é essencial para assegurar a eficácia e a equidade desse processo fundamental para o desenvolvimento econômico do país.

[1] Lei 8.929/1994: Artigo 11. Não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os créditos e as garantias cedulares vinculados à CPR com liquidação física, em caso de antecipação parcial ou integral do preço, ou, ainda, representativa de operação de troca por insumos (barter), subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, salvo motivo de caso fortuito ou força maior que comprovadamente impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.

[2] […] §6º Nas hipóteses de que tratam os §§2º e 3º do artigo 48 desta Lei, somente estarão sujeitos à recuperação judicial os créditos que decorram exclusivamente da atividade rural e estejam discriminados nos documentos a que se referem os citados parágrafos, ainda que não vencidos.

[3] […]§7º Não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os recursos controlados e abrangidos nos termos dos artigos 14 e 21 da Lei nº 4.829, de 5 de novembro de 1965.

[4] […] §9º Não se enquadrará nos créditos referidos no caput deste artigo aquele relativo à dívida constituída nos três últimos anos anteriores ao pedido de recuperação judicial, que tenha sido contraída com a finalidade de aquisição de propriedades rurais, bem como as respectivas garantias.

[5] §3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o §4º do artigo 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

§4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do artigo 86 desta Lei.

[6] Vide: Código Civil e Estatuto da Terra.

 

Fonte: Conjur.

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