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07-10-2025
Crédito do representante comercial avança em casos de recuperação judicial e falênciav
STJ reconhece natureza alimentar e equiparação aos trabalhistas; garantindo prioridade no recebimento e maior segurança jurídica.
No cenário econômico atual, em que empresas de diferentes setores são atingidas pela instabilidade econômica, é cada vez mais comum que os representantes comerciais se deparem com mais um desafio: o deferimento do processamento de recuperação judicial ou então a decretação de falência das empresas que representam. Com isso, os representantes precisam buscar o recebimento de seus créditos nestes processos concursais, que, muitas vezes, são complexos e têm longa duração.
Por isso, é preciso ter atenção no acompanhamento dos processos das devedoras e na classificação e forma de pagamento dos valores que lhes são devidos.
Em 2025, o STJ estabeleceu uma posição importante sobre a classificação dos créditos dos representantes comerciais em processos de recuperação judicial e falência no julgamento do REsp 2.168.185, com origem no estado do Piauí.
Pela primeira vez em um julgamento colegiado, o STJ estabeleceu que os créditos dos representantes, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, têm natureza alimentar e, portanto, devem ser equiparados aos créditos trabalhistas e pagos com a prioridade legal prevista na lei 11.101/05 (lei de recuperação judicial e falências).
Durante muito tempo, os Tribunais divergiam sobre o enquadramento dos créditos dos representantes comerciais no Quadro de Credores das recuperandas ou falidas. As devedoras costumavam habilitá-los no processo de recuperação judicial na Classe dos Credores Quirografários (no caso de representantes constituídos como Sociedades Limitadas) ou então na Classe dos Credores Micro ou Empresas de Pequeno Porte para representantes constituídos sob estes modelos.
Isso porque, em regra, os Planos de Recuperação Judicial das devedoras preveem o pagamento dos créditos listados nestas classes com descontos expressivos, carência e quitação em longuíssimo prazo.
Pelo precedente mais recente, a maioria dos ministros da 3ª turma do STJ entenderam que, ainda que representante comercial atue como uma pessoa jurídica, o seu crédito deverá ser equiparado ao crédito trabalhista que, por seu caráter alimentar, possui algumas prerrogativas como ser pago no prazo máximo de 12 anos ou, então, contar com uma garantia do pagamento em um prazo máximo de 36 meses (art. 54 da lei 11.101/05).
A decisão vencedora, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas, é baseada na interpretação do art. 44 da lei 4.886/1965 (lei que regula as atividades dos representantes comerciais autônomos), em sua redação mais recente, dada pela lei 14.195/21:
Art. 44. No caso de falência ou de recuperação judicial do representado, as importâncias por ele devidas ao representante comercial, relacionadas com a representação, inclusive comissões vencidas e vincendas, indenização e aviso prévio, e qualquer outra verba devida ao representante oriunda da relação estabelecida com base nesta lei, serão consideradas créditos da mesma natureza dos créditos trabalhistas para fins de inclusão no pedido de falência ou plano de recuperação judicial. (Redação dada pela lei 14.195, de 2021)
Parágrafo único. Os créditos devidos ao representante comercial reconhecidos em título executivo judicial transitado em julgado após o deferimento do processamento da recuperação judicial, e a sua respectiva execução, inclusive quanto aos honorários advocatícios, não se sujeitarão à recuperação judicial, aos seus efeitos e à competência do juízo da recuperação, ainda que existentes na data do pedido, e prescreverá em 5 (cinco) anos a ação do representante comercial para pleitear a retribuição que lhe é devida e os demais direitos garantidos por esta lei. (Redação dada pela lei 14.195, de 2021)
Segundo a decisão firmada, a lei não fez distinção entre pessoas físicas e jurídicas. Portanto, se o legislador não fez diferenciação, não caberia ao judiciário fazê-la, sob pena de restringir indevidamente a abrangência da norma. Outro ponto destacado na decisão é que o representante legal pessoa física pode ter inúmeros contratos de representação, enquanto o representante pessoa jurídica pode ser representante exclusivo da devedora. Portanto, caso sobrevenha a falência da empresa representada, o representante comercial que atua como pessoa jurídica perderá sua única fonte de renda, muito mais se aproximando do empregado que vê seu contrato de trabalho encerrado do que o representante pessoa física.
Relevante frisar que decisão analisada não dá margem para a caracterização do representante comercial como um empregado da empresa. O que é estabelecido, apenas, é que, nos processos concursais de falência e recuperação judicial, estes profissionais deverão ter seus créditos equiparados aos créditos trabalhistas, para o fim de, dentro dos critérios legais, permitir que verbas alimentares sejam pagas aos representantes comerciais com prerrogativas diversas daquelas que, em regra, não alcançam os pagamentos dos créditos quirografários e das Micro e Pequenas empresas.
A decisão do STJ representa um marco para os representantes comerciais: ao pacificar o entendimento sobre a natureza alimentar de seus créditos, garante-se não apenas prioridade no recebimento, mas também maior segurança jurídica em um cenário de crise e incerteza. Trata-se de um avanço na proteção desses profissionais, que passam a ter seus direitos reconhecidos de forma compatível com a relevância econômica e social de sua atividade.
Fonte: Migalhas.