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19-03-2016
Com perícia prévia, juiz reduz em 30% número de casos de recuperação judicial
Nos dois primeiros meses de 2016 foram solicitadas 347 recuperações judiciais, número 13% maior que o registrado em 2015. Desse total, 283 planos foram deferidos pelos juízos responsáveis, aumento de 16% se comparado ao mesmo período do ano anterior. Em meio a esse crescimento de pedidos, ocasionado em parte pela crise econômica, um procedimento anterior à análise da viabilidade do plano de recuperação pode dinamizar o procedimento, evitando que empresas com grandes chances de falência fiquem tentando adiar o inevitável.
A perícia prévia, criada pelo juiz da 1ª Vara de Falência do Tribunal de Justiça de São Paulo, Daniel Costa, segundo dados do próprio magistrado, impede 30% das empresas que pedem recuperação judicial de chegar efetivamente ao judiciário. Porém, na outra ponta, garante que as 70% restantes consigam, pelo menos, sobreviver aos dois primeiros anos do plano, que é o período em que ocorre a fiscalização sobre o cumprimento dos objetivos estabelecidos. “O índice de sucesso obtido aqui [1ª Vara de Falências] é maior que a média nacional. É muito bom”, diz Costa à ConJur.
Dados compilados pelo julgador entre fevereiro de 2011, data em que passou a atuar na Vara, a agosto de 2015 mostram que apenas 58 pedidos, dos 157 feitos no período foram indeferidos, ou seja, 36% do total. “De todos os casos em que eu deferi a Recuperação Judicial, dois terços, ou seja, 70%, das empresas tiveram sucesso. Elas conseguiram ter o plano aprovado e vencer o prazo de dois anos de fiscalização”, afirma o magistrado.
Daniel Costa destaca que esse tipo de medida adotada por ele não é comum, mas uma campanha junto ao Conselho Nacional de Justiça, com a ajuda da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, busca expandir a aplicação do procedimento. “Você evita jogar nas costas da sociedade e dos credores o peso de todo um processo de recuperação natimorto, que não tem a menor condição de prosperar.”
“Você tem diversos casos em que a empresa pede recuperação, mas não gera emprego, não produz, ela não existe mais e está pedindo a recuperação para fazer um acertamento dos seus débitos”, complementa o magistrado, explicando que esse não é o objetivo da recuperação judicial. “A recuperação busca manter os benefícios econômicos e sociais que decorrem da atividade empresarial: emprego, tributos, entre outros”, diz.
Vendo o outro lado da perícia, o advogado Renato Mange conta que já até debateu o tema com o juiz Daniel Costa e apresentou pontos que considera prejudiciais à companhia proponente à empresa em recuperação. Segundo ele, o procedimento deve servir apenas para ver se os documentos apresentados estão de acordo, e não analisar a viabilidade econômica da companhia. “Quem vai dizer a viabilidade da empresa são os credores”, argumenta.
O ponto de inflexão entre os dois é justamente a extensão dessa perícia prévia. Enquanto o juiz acha que a medida deve analisar se a empresa é viável, o advogado entende que o procedimento deve analisar uma eventual inviabilidade. “Ele [o juiz Daniel Costa] está chegando a uma conclusão de que essa perícia prévia não é para isso. É para ver se a documentação está correta, se a empresa está funcionando”, afirma o advogado.
“Na minha avaliação, ela seria desnecessária se os documentos estiverem em ordem”, complementa Mange. Segundo ele, deve contar também o tempo gasto com a perícia, pois isso pode influenciar em como bancos, fornecedores e trabalhadores veem a empresa que pediu a recuperação judicial. A demora, de acordo com Renato, pode levar o mercado a crer que o juiz não aceitou o plano. “A empresa pode morrer se não for logo atendida”, diz, ressaltando a eficiência de Costa, que tem dado até cinco dias para conclusão das perícias.
Falta de opção
Para os advogados Rodrigo Quadrante, do Leite, Tosto e Barros Advogados, e Antônio Freitas, do Luchesi Advogados, explicam que a explosão de recuperações judiciais é resultado direto da crise econômica que o Brasil atravessa. “É um reflexo da própria recessão que o país vive”, afirma Quadrante.
Antônio Freitas explica que o problema é resultado da crise política, da elevação do dólar e do aumento da taxa de juros básicos (Selic), que encarece o dinheiro tomado pelos bancos que será novamente emprestado ao consumidor final. “Hoje é crise 100%”, diz. Segundo ele, o cenário não está pior, em partes, pelo custo de se pedir a recuperação judicial.
Quadrante explica que a recuperação judicial é usada como alternativa à falência, pois, a negociação informal é algo complicado. Também diz os empresários, mesmo a contragosto, muitas vezes fazem o pedido à Justiça antecipadamente para evitar a quebra. “A recuperação não é uma opção. É uma falta de opção”, argumenta.
Postura conservadora
Uma das saídas muito usadas pelas empresas que pedem recuperação judicial para viabilizar seus planos é a venda de imóveis para obter capital. Segundo Ana Beatriz Lobo, do Veirano Advogados, as companhias nacionais, assim como a população, são conservadoras em seus investimentos. “Empresa brasileira gosta muito de fazer poupança em imóvel. Brasileiro gosta de tijolo”, conta.
A advogada explica que os pedidos de recuperação fazem com que a necessidade de capital seja urgente, e isso faz com que os valores do bem caiam. Porém, destaca que isso varia conforme a situação da companhia, o ramo em que atua e o tipo do imóvel. “Se a empresa já estiver em vias de recuperação judicial, quem comprar antes de o plano ser aprovado terá que assumir esse passivo. Com o plano, essa responsabilidade não existe mais”.
Ana Lobo também conta que uma alternativa que tem sido usada por empresários é a venda do imóvel onde atuam para que aluguem o bem do comprador. “Para fazer caixa, acha-se um investidor, ou uma empresa especializada nesse tipo de negócio, e vende-se este imóvel e aluga-se de volta dele a longo prazo”, diz.
Seu colega de escritório, Raphael Moreira afirma que iniciativa tornou-se “uma operação mais aceita no mercado nos últimos anos”. Ele explica, ainda, que o comprador teria que se mostrar disposto a alugar esse imóvel por um preço já combinado com o vendedor por um longo período. “É uma venda com aluguel de volta”, resume.
Por Brenno Grillo
Fonte: ConJur