Ir para o Conteúdo da página Ir para o Menu da página

Como você avalia a
experiência em nosso site?

x
Avaliacao

Ruim

Ótima

Whatsapp

NOTÍCIAS

Sem Foto

17-06-2020 

As crises e suas oportunidades: Abordagem sobre a alienação de ativos na recuperação judicial e na falência

Por Bruno Pereira Portugal

 

Vivenciamos tempos de crise, provocada pela pandemia do covid-19. O elevado grau de contaminação do vírus vem causando um verdadeiro drama de saúde pública, e as ações de combate à sua propagação geram reflexos negativos na economia, atingindo de forma mais enfática empresas de menor porte. Entretanto, ninguém discorda que emergem excelentes oportunidades em períodos tais.

Com efeito, é natural que gestores de empresas em crise econômico-financeira passem a avaliar a adoção de recuperação judicial e extrajudicial, como instrumentos a possibilitar a preservação da respectiva atividade, ou mesmo a necessidade de pedido de liquidação judicial (autofalência), caso concebam a inviabilidade de superação daquele estado. Lado outro, não menos correto é que a alienação de ativos no bojo desses expedientes tem o condão de se revelar extremamente oportuna para as pessoas que pretendem empreender ou ampliar um empreendimento já constituído.

Com a recuperação judicial, atendidos determinados requisitos de ordem subjetiva e objetiva, o empresário pode satisfazer o seu passivo anterior ao pedido – à exceção dos que àquela não se sujeitam, como exemplos principais os créditos tributários e os decorrentes de alienação fiduciária – no modo que dispuser um plano a ser oferecido aos credores. É neste plano que são indicados os meios e as condições pelos quais se assentará a estratégia de soerguimento da empresa (lei 11.101/05, art. 50), admitindo-se, dentre outras medidas, a realização de trespasse ou arrendamento de estabelecimento, incluindo filiais ou unidades produtivas isoladas.

Já na falência, é dever do administrador judicial nomeado efetuar a arrecadação e a avaliação dos bens do empresário, separadamente ou em bloco (lei 11.101/05, art. 108), para que, logo após, seja promovida a alienação dos mesmos, observada a seguinte ordem de preferência: (I) alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco; (II) alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isoladamente; (III) alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabelecimentos; (IV) alienação dos bens individualmente considerados (lei 11.101/05, art. 140).

Como se nota, é possível, na recuperação judicial, e preferível, na falência, que ocorra alienação de ativos em bloco, seja do estabelecimento empresarial, seja de filiais ou unidades produtivas isoladas. A ideia é de que o conjunto de bens tem muito mais valor do que a soma de cada um dos bens individuais. A alienação é feita em leilão, por lances orais; em propostas fechadas; em pregão; ou, ainda, através de qualquer outra modalidade que se mostre mais vantajosa (lei 11.101/05, arts. 142 e 145).

A grande oportunidade que exsurge em operações dessa espécie se dá pelo fato de os bens individuais já se encontrarem conjugados, além da circunstância de o preço a ser pago pelo bloco de ativos tender a ser menor do que o respectivo custo de montagem.

De mais a mais, e aí reside a mais notória atratividade, o objeto da alienação é livre de qualquer ônus e não ocorre a sucessão do arrematante nas obrigações do empresário em recuperação judicial ou falido, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho (lei 11.101/05, art. 60, parágrafo único, e art. 141, II). Os empregados do devedor contratados pelo arrematante são admitidos mediante novos contratos de trabalho, não respondendo este por obrigações relacionadas ao contrato anterior (lei 11.101/05, art. 141, §2º).

Registra-se que o STF, na ação direta de inconstitucionalidade 3.934/DF, assentou que a previsão legal de ausência de sucessão de crédito trabalhista não viola a Constituição. Em seu voto, o relator, ministro Ricardo Lewandowski, consignou que o legislador “optou por dar concreção a determinados valores constitucionais, a saber, a livre iniciativa e a função social da propriedade – de cujas manifestações a empresa é uma das mais conspícuas – em detrimento de outros, com igual densidade axiológica, eis que os reputou mais adequados ao tratamento da matéria”.

Quadra salientar também que a não sucessão do arrematante possui exceções, voltadas a coibir o correspondente desvio de finalidade. Assim, haverá sucessão quando o arrematante for sócio da sociedade em recuperação judicial ou falida, ou sociedade controlada por esta; parente, em linha reta ou colateral até o 4º grau, consanguíneo ou afim, do empresário em recuperação judicial ou falido; ou identificado como agente do mesmo com o objetivo de fraudar a sucessão (lei 11.101/05, art. 141, §1º).

Em que pese todas essas nuances atrativas, a realidade prática que se mostra é que, de maneira geral, os empreendedores não dão a devida atenção às referidas alienações. Isso acontece não em razão de gargalos regulatórios – ao contrário, a legislação oferece condições inquestionavelmente favoráveis, como se apontou –, e sim pelo sentimento de repulsa de aquisição de bens em processos de recuperação judicial e falência, e, em última análise, pela falta de conhecimento das questões que envolvem tal operação.

É preciso que o empreendedor se atente para as oportunidades que surgem dos tempos de crise, a exemplo da que aqui se apresenta. Essa atenção vem beneficiar a própria economia, tendo em vista a realocação de ativos para agentes que os possam explorar de forma mais eficiente, inclusive com manutenção de postos de trabalho, sem risco de assumir qualquer passivo anterior.

Fonte: Migalhas

Perguntas e respostas

Sem Foto