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08-08-2022 

A decisão da 2ª Seção do STJ no RESP 1655705/SP e a natureza da lista de credores na Recuperação Judicial

Recente notícia veiculada em periódicos eletrônicos, dão conta do julgamento realizado pela 2ª seção do STJ, no que se refere ao RESP 1655705 / SP, através do qual os I. ministros entenderam que o plano de recuperação judicial se aplica a todos os credores da companhia em recuperação judicial, ainda que seu nome não tenha sido veiculado na lista ou no quadro geral de credores. O acórdão ainda pende de publicação.

Com isso, reformaram decisão anterior, no sentido de que o credor não listado poderia promover/prosseguir com ação autônoma para cobrança de seu crédito, sem a necessidade de observância das balizas estabelecidas pelo plano aprovado, ou seja, considerando o instrumento materializado do direito creditício.

De início, entendemos como correto o julgamento, uma vez que sob o prisma do entendimento anterior havia clara deturpação da par conditio creditorum, dando ao devedor a faculdade de "escolher" quais credores gostaria de ver sujeitos ao plano que pretendia ver aprovado. Se sua opção passasse despercebida pelo administrador judicial, com a homologação da lista e sua transformação em quadro geral de credores, restaria aberta a via para posterior pagamento integral do crédito, em descompasso com os credores listados.

Através do julgamento em comento, o STJ reafirmou o espírito da lei 11.101/05, de submeter os credores a um efetivo concurso (excluindo aqueles expressamente excepcionados pela lei), sem que haja brecha para favorecimentos.

Outro efeito do julgamento repercute na própria natureza da lista de credores, que não opera qualquer efeito sobre o direito material dos credores. Quer dizer,  o fato de que determinado crédito ou credor não constar na lista de credores não implica que ele não esta sujeitos aos efeitos recuperacionais.

Com isso, a lista de credores, na recuperação judicial, tem um primeiro e maior efeito, que é a ordenação do direito de voto dos credores, documento a partir do qual serão formados os quóruns da assembleia geral de credores, de instalação, votação do plano e de assuntos gerais.

Com isso, ao contrário do entendimento anterior, objeto de reforma da decisão em análise, a omissão de determinado crédito da lista não tem força para torna-lo excluído do processo recuperacional e, consequentemente, dos efeitos do plano de recuperação judicial.

O fato de o credor não constar nas listas lhe trará o ônus de não poder participar da assembleia geral de credores, exercendo com plenitude o seu direito a negociação e voto, quando poderá se posicionar contrário ou favoravelmente ao plano, bem como se portar de modo a ver seus interesses atendidos, caso assim entenda, através do uso do direito de voz que somente os arrolados possuem. Não a toa o voto do credor arrolado, que não comparece ao ato de instalação da assembleia é considerado como "abstenção", não sendo computado para o próprio quórum de instalação do ato assemblear.

Todavia, a abstenção do credor arrolado implica no fato de aceitar o veredito da assembleia, a ele se sujeitando. Aprovado o plano, estará sujeito aos seus efeitos. Este é o mesmo destino do credor não arrolado na lista de credores, cujo crédito efetivamente se sujeite aos efeitos da recuperação judicial, uma vez que constituído em momento anterior ao seu ajuizamento.

Neste sentido, há que se fazer o questionamento da situação inversa: e a condição do credor que, por previsão legal, está excluído dos efeitos da recuperação judicial, como o detentor de garantia por alienação fiduciária? Estando ele arrolado na lista de credores da recuperanda, e sendo mantido pelo AJ, seu crédito passa a se tornar sujeito?

Partindo da mesma premissa a resposta é não, já que a inserção ou omissão de nomes na lista de credores não tem o "poder" para alterar a relação de direito material havida entre credor e devedor, sendo que a sujeição ou não de determinado crédito decorre de lei, cabendo o reconhecimento de sujeição única e exclusivamente ao poder judiciário, não tendo o devedor ou o administrador judicial poderes para alterar esta relação, em decorrência do basilar princípio da reserva da jurisdição, materializado no devido processo legal, sustentáculo do Estado de Direito.

Neste diapasão, em teoria, sequer seria necessário que o credor indevidamente arrolado manejasse qualquer expediente extrajudicial ou judicial para ver seu nome excluído, sendo-lhe facultado exercer diretamente as medidas adequadas para cobrança (consolidação de propriedade, execução etc.).

Tanto o é que a própria lei previu que equívocos na lista de credores devem ser corrigidos através da apresentação de incidentes extrajudiciais (art. 7º, §1º) de divergência (quando o crédito estiver arrolado em valor maior ou a menor, ou em classe incorreta) ou habilitação (quando o crédito não tiver sido arrolado); ou judicial (art. 8º), de impugnação a lista de credores, (quando eventuais incorreções apontadas não foram total ou parcialmente acatadas pelo administrador judicial). Além disso existe a possibilidade da habilitação retardatária (art. 10), bem como manejo de ação ordinária, conforme prescrição do art. 10, §6º da lei recuperacional.

Em todos os casos a lei prevê mecanismos de inclusão de crédito na lista de credores, não se podendo ignorar que se trata de previsão destinada também ao instituto falimentar. Neste caso, a presença na lista credores tem espectro maior, pois somente os efetivamente arrolados é que terão direito ao recebimento de valores, na medida em que todo e qualquer pagamento é feito através do feito falimentar, inclusive dos créditos cujas execuções podem prosseguir, como no caso dos executivos fiscais.

Assim, se o credor que tem seu crédito sujeito aos efeitos recuperacionais não vê seu nome arrolado, cabe manejar o incidente judicial ou extrajudicial correto única e tão somente para ter garantido seu direito de voto. Na eventualidade de não ter interesse em participar do ato assemblar, como um credor detentor de um crédito pequeno, por exemplo, basta acompanhar o feito, para que quando do início dos pagamentos tome as medidas necessárias ao recebimento de seu crédito nos moldes do plano aprovado. Usualmente os planos aprovados exigem a indicação de contas pelos credores, seja no processo ou diretamente ao setor financeiro da devedora.

Já o credor não sujeito, mas que fora arrolado indevidamente, lhe remanesce o direito de ação de modo a perseguir seu crédito pela via ordinária, distribuindo sua ação ao juízo competente, não havendo vinculação direta ao juízo recuperacional, posto que o crédito não recebe efeitos da decisão de deferimento do processamento. Ao nosso ver não há sequer necessidade de manejar qualquer incidente que busque ver seu nome excluído da lista, já que não é a lista que implica na sujeição do crédito ou não, mas sim a data de sua constituição e o fato de estar ou não encaixado nas hipóteses de exceção.

Portanto, a decisão do STJ alinha com correção o tratamento dos créditos na recuperação judicial, evidenciando que a lista de credores é nada mais que uma lista voltada a organizar o quórum da assembleia de credores (repita-se, nos casos de RECUPERAÇÃO JUDICIAL), não emanando efeitos sobre os direitos de crédito dos devedores indistintamente, ao livre critério do devedor e do administrador judicial.

Ademais, a decisão reforça o fato de que ao administrador judicial é dada a missão de fazer a conferência com a máxima amplitude da lista de credores, incluindo e excluindo credores independentemente do manejo de incidentes por estes. Ainda que sirva de supedâneo a Assembleia Geral de Credores, deve a lista refletir com a maior exatidão possível o endividamento do devedor, fato que pode afetar o julgamento dos votantes sobre conceder ou não o benefício legal da recuperação judicial, já que uma lista enxuta, com poucos credores, pode dar a falsa impressão de que o passivo é facilmente sanável, o que pode não ser verdade.

Por fim e não menos importante, no que se refere ao credor não sujeito que maneja a ação ordinária em juízo diverso, é certo que haverá a discussão sobre a sujeição ou não do crédito aos efeitos da recuperação judicial. Daí nasce a discussão acerca da competência sobre tal decisão, se caberia ao juízo recuperacional ou ao juízo comum.

Isto, porém, é assunto para outro momento de reflexão.

Fonte: Migalhas

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