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18-02-2021 

A 'atualização' da Lei 11.101/2005 pela Lei 14.112/2020

Esta coluna, na linha das preocupações da Rede de Pesquisa vinculada ao Direito Civil Contemporâneo, faz uma análise sobre até que ponto a transformação legislativa realizada na Lei de Falências e Recuperação Judicial traz novidades ou consolida construções da jurisprudência brasileira.

Discutida desde 2016, a atualização da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (LFRE) teve sua relevância acrescida pela urgência de uma resposta do Poder Legislativo à crise econômica e social decorrente da pandemia da Covid-19.

Publicada em 24 de dezembro de 2020, a Lei 14.112 modificou significativamente o sistema de insolvência brasileiro, no entanto, muitas das alterações promovidas pela Lei 14.112/2020 apenas positivam medidas que já vinham sendo amplamente praticadas pelas varas especializadas e, da mesma forma, amplamente debatidas na jurisprudência. Sob esse ponto de vista, sem descurar que há realmente novidades, como os capítulos sobre mediação e insolvência transnacional, em sua essência, a Lei 11.101/2005 foi atualizada pela Lei 14.112/2020.

Entre os aspectos já aplicados estão a possibilidade de consolidação processual e substancial em casos que envolvem grupos empresariais, de reconhecimento do abuso do direito de voto pelo credor, de prorrogação do stay period e de encerramento da recuperação judicial antes de findado o período de carência previsto no plano de recuperação judicial (PRJ) e independente da consolidação do quadro geral de credores. A experiência da aplicação da Lei 11.101/2005 nos últimos anos comprovou que, não obstante a consagração na prática, ainda era necessária a regulação dessas medidas para garantir tratamento isonômico a todas as empresas em crise.

No âmbito da falência, a atualização — que não significa novidade — que chama a atenção é o ressurgimento da "falência sumária", que visa a abreviar o processo falimentar na hipótese de falência frustrada, ou seja, quando os bens arrecadados, se houverem, forem insuficientes para as despesas do processo. A abreviação do procedimento era prevista no artigo 75 do Decreto-Lei 7661/1945 e não tinha previsão correspondente na Lei 11.101/2005 até então. A ausência de previsão expressa no sistema da Lei 11.101/2005, todavia, não impediu que alguns processos falimentares frustrados fossem encurtados independente do denunciado desvirtuamento do instituto na vigência do decreto-lei, mas impediu a sua utilização desenfreada. A repristinação desse instituto se harmoniza com as recentes manifestações legislativas de viés mais liberal, pois tira do Poder Judiciário e devolve ao mercado (credores) a decisão — e os ônus — do prosseguimento da falência.

A Lei 14.112/2020 ainda consolida na LFRE normas antes previstas em legislação esparsa, como a proibição da distribuição de lucros e dividendos, que até então era aplicada com fundamento subsidiário na Lei das S.A., a necessidade de respeito à convenção de arbitragem e o próprio regramento atinente às obrigações tributárias.

Sobre a subsidiariedade de outros diplomas legais, a atualização da LFRE busca uma maior completude em relação a aspectos que lhe são especiais. Houve o abandono do CPC no que concerne aos prazos e recursos aplicáveis e a adoção de preceitos diversos daqueles previstos no diploma processual, ilustram essa mudança a fixação de prazos em dias corridos, o cabimento de agravo de instrumento como regra geral para impugnação de decisões e a impossibilidade de discussão sobre preço vil na alienação de bens.

Ademais, a lei atualizada se coaduna com a tendência de adoção de sistemas eletrônicos pelo Poder Judiciário ao prever a utilização de meios digitais para publicação de editais, para intimação dos interessados e para realização de atos "extra-autos" como a assembleia de credores e o leilão, por exemplo. No entanto, a Lei 14.112/2020 perdeu a oportunidade de dispor sobre norma mais específica no tocante a aplicação da Lei do Processo Eletrônico (Lei 11.419/2006) sobre as intimações e os prazos previstos na LFRE. Essa circunstância pode dar azo a discussões sobre a validade e tempestividade dos atos praticados, o que pode gerar insegurança e distorções.

Quanto a isso, a proposição genérica disposta na nova redação do artigo 191 mais confunde do que esclarece, pois não é razoável entender que a LFRE desobrigue a publicação dos editais nela previstos pela imprensa oficial, exigindo essa formalidade apenas em relação aos editais do artigo 52, §1º, e do artigo 36 — únicos dispositivos que determinam a publicação em órgão oficial —, e não em relação ao do artigo 99, parágrafo único, por exemplo, que não contém essa especificação. Seguindo o entendimento manifestado pelo STJ no REsp 1.758.777, a publicação na imprensa oficial é sempre devida, sob pena de nulidade, de modo que a nova redação se restringiria às hipóteses que antes exigiam publicação de edital em jornais de ampla circulação.

Apesar de alguns lapsos, a positivação de práticas consolidadas, o acompanhamento de tendências e a convergência de normas esparsas em um único diploma também foram acompanhadas por verdadeiras inovações no direito brasileiro da empresa em crise, as quais merecem ser tratadas em texto próprio.

*Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Roma II).

Fonte: ConJur

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