Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
Vara Regional de Rec. Judiciais, Falências e Concordatas da Comarca de Florianópolis

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Recuperação Judicial Nº 5052498-75.2020.8.24.0023/SC

AUTOR: GAR TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA

AUTOR: BIGUACU TRANSPORTES COLETIVOS ADMINISTRACAO E PARTICIPACOES LTDA (Em Recuperação Judicial)

AUTOR: GAR - PARTICIPACOES LTDA

RÉU: OS MESMOS

SENTENÇA

I. RELATÓRIO

BIGUAÇU – TRANSPORTES COLETIVOS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA; GAR - TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA e GAR PARTICIPAÇÕES LTDA ajuizaram pedido de recuperação judicial, com fundamento nos artigos 47 e seguintes da lei 11.101/2005, em 07/07/2020.

Após a realização de constatação prévia (evento 11), foi deferido o processamento da recuperação judicial, nos termos do artigo 52, caput da referida lei, no dia 12/07/2020, conforme evento 13, nomeando Glaudius Consultoria e Gestão Empresarial como administradora judicial, que aceitou o encargo e prestou compromisso legal (evento 35).

O plano de recuperação judicial foi apresentado no evento 154, publicado, conforme evento 196, sendo apresentadas as seguintes objeções: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (evento 195); ADRIANO MOREIRA DA SILVA (evento 197); BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A (evento 288); ITAÚ UNIBANCO S.A (evento 299); IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S/A (evento 291); ROSALVO ESTEFANO GUESSER (evento 292); CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A (evento 296); MARCOS ANTÔNIO JUNCKES (evento 310); BANCO DO BRASIL S/A (evento 336) e POOL EMPRESARIAL S/A – TRIO CARD (evento 337), sendo, portanto, convocada a assembleia geral de credores para deliberação (evento 344).

Publicado o edital da assembleia geral de credores (evento 569) foi concedida a prorrogação do stay period (evento 607), e determinada a suspensão do procedimento de consolidação da propriedade fiduciária do imóvel registrado perante o Ofício de Registro de Imóveis da comarca de Biguaçu/SC, matrícula n. 4.769 (evento 680).

Sobreveio ata da primeira convocação da assembleia geral de credores (evento 737), que, inciada em 10/02/2021 restou prejudicada por não se ter atingido o quórum mínimo de mais da metade dos créditos de cada classe.

Na sequência, o SINDICATO DOS TRABALHADORE EM TRANSPORTE DE PESSOAS EM FLORIANÓPOLIS E REGIÃO, em petição fundamentada no evento 760, requereu a suspensão da assembleia geral de credores, o que restou indeferido no evento 767.

A segunda convocação da assembleia geral de credores foi então instalada em 23/02/2021, suspensa por votação da maioria, com continuidade prevista para o dia 25/05/2021 (evento 837). Reiniciada, restou novamente suspensa (evento 1002) com continuidade agendada para a data de 25/08/2021.

No evento 1101 foi deferido o pedido para que fosse oficiado, com urgência, ao juízo da 4ª Vara Federal de Florianópolis/SC, para proceder à imediata transferência em conta vinculada ao presente feito dos valores devidos pelas recuperandas até a data do pedido de recuperação judicial depositados na subconta vinculada aos autos da ação ordinária n. 5001616-79.2015.4.04.7200.

Novamente restou pleiteado pela recuperanda a prorrogação do stay period (evento 1231), o que restou deferido até a conclusão da assembleia geral de credores (evento 1278).

Com a continuidade da assembleia, sua conclusão foi novamente adiada para o dia 23/09/2021 (evento 1289). Na sequência, as recuperandas apresentaram um modificativo ao plano de recuperação judicial (evento 1435).

Na data aprazada, discorrido sobre o modificativo de plano e após deliberação dos credores, restou aprovado o plano de recuperação judicial, juntamente com o seu modificativo, mediante a concordância da maioria de seus credores (evento 1643).

É, em síntese o relatório.

DECIDO:

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Plano de recuperação judicial

O plano de recuperação judicial foi apresentado no evento 154, que posteriormente recebeu um modificativo (evento 1435). No ato assemblear, restou ainda formalizado aditivo que, após votação foi aprovado por maioria, nos termos do que esclareceu o administrador judicial no evento 1643:

na classe de credores trabalhistas, 336 (trezentos e trinta e seis) do total de 574 (quinhentos e setenta e quatro) credores votaram pela aprovação, equivalente a 58,53% (cinquenta e oito vírgula cinquenta e três por cento) dos créditos aptos à votação, sendo que 1 voto correspondeu à abstenção;

no tocante aos credores com garantia real, houve aprovação por 01 (um) do total de 02 (dois) credores aptos à votação, correspondendo em valores a importância de R$ 3.357.772,00 (três milhões, trezentos e cinquenta e sete mil, setecentos e setenta e dois reais) do total de R$ 3.817.772,00 (três milhões, oitocentos e dezessete mil, setecentos e setenta e dois reais), ou, 87,95% (oitenta e sete vírgula noventa e cinco por cento) dos créditos;

quanto aos credores quirografários, houve aprovação por 14 (quatorze) credores, no total de 17 (dezessete) credores aptos à votação, correspondendo em valores a importância de R$ 9.095.037,80 (nove milhões, noventa e cinco mil, trinta e sete reais e oitenta centavos) do total de R$ 11.983.730,54 (onze milhões, novecentos e oitenta e três mil, setecentos e trinta reais e cinquenta e quatro centavos), ou, 75,89% (setenta e cinco vírgula oitenta e nove por cento) dos créditos;

por fim, dos credores da classe de microempresas ou empresa de pequeno porte, todos os 02 (dois) credores votaram pela aprovação, equivalente a 100% (cem por cento) dos créditos aptos a votação. (evento 1643, PET1, pág. 2/3)

Compete exclusivamente à assembleia geral de credores, deliberar sobre a viabilidade econômica do plano de recuperação judicial e a capacidade de cumprimento da devedora. Friso que a assembleia é soberana. Ao Poder Judiciário cabe a análise da legalidade do plano de recuperação apresentado e aprovado pelo órgão assemblear, que poderá ter sua homologação postergada ou condicionada a correções, de modo a se adequar a forma da lei.

Antecipadamente, se observa que desde o deferimento do processamento da recuperação judicial, as sociedades empresariais continuam operando normalmente. Portanto, estão em atividade, arrecadam tributos, possuem funcionários ativos, gerando emprego e renda e exercem sua atividade. Desta forma preenchem todos os requisitos do art. 47 da Lei 11.101/2005,quel tem como objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira das devedoras, com foco na manutenção da fonte pagadora, dos empregos e dos interesses dos credores.

Desse modo, comprovada a regular atividade das sociedades empresárias, deve o feito prosseguir nos seus ulteriores termos, com a homologação do resultado assemblear e a consequente concessão da recuperação judicial em favor de BIGUAÇU – TRANSPORTES COLETIVOS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA; GAR - TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA e GAR PARTICIPAÇÕES LTDA.

 Todavia, em razão do disposto nos planos de recuperação judicial apresentados, há necessidade de intervenção do juízo a fim de decidir a respeito os seguintes pontos cruciais:

2. Extensão dos efeitos da recuperação judicial e liberações de garantia

No item 7 do plano de recuperação judicial do evento 154, consta o que segue:

a) a aprovação do plano em assembleia ou na hipótese da lei 11.101/05 art. 58:

i.  obrigará as RECUPERANDAS BIGUAÇU – TRANSPORTES COLETIVOS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA; GAR - TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA e GAR PARTICIPAÇÕES LTDA, os credores sujeitos à recuperação, assim como seus respectivos sucessores a qualquer título e,

ii. Implicará em novação de todas as obrigações sujeitas, tanto para as recuperandas quanto para avalistas e/ou garantidores de modo geral nos termos e para os efeitos propostos no presente Plano e, em consequência:

b) Extinção de todas as ações e execuções movidas em desfavor das sociedades BIGUAÇU – TRANSPORTES COLETIVOS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA; GAR - TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA e GAR PARTICIPAÇÕES LTDA e/ou avalistas e garantidores. (evento 154, OUT4, Pág. 9/10)

A premissa, nos termos em que restou definida, afronta dispositivos de lei e entendimento sumular que desautorizam sua aprovação pelo juízo e, por consequência, carecem de alteração.

Isto porque, primeiramente não há como se estender os efeitos da recuperação judicial aos coobrigados, fiadores e afins, de modo a impedir que os credores possam, contra eles, perseguir seu crédito, nos termos do §1º do art. 49 e do art. 59 da Lei nº 11.101/2005:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.

Além disso, a Súmula 581 do STJ aborda o tema de modo a não deixar dúvidas quanto a aplicabilidade dos citados dispositivos de lei:

A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória. STJ. 2ª Seção. Aprovada em 14/09/2016, DJe 19/09/2016 (Info 590).

Tal súmula só confirmou entendimento há muito aplicado nos Tribunais Superiores, e cujo termo se destaca, é inverso ao disposto na premissa ora questionada:

Em julgamento proferido pelo rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, assentou o Superior Tribunal de Justiça que "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigado sem geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n.11.101/2005"." (REsp 1333349/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 26/11/2014, DJe 2/2/2015) [...]".  (AgRg no AREsp  579915 SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, Julgado em 16/02/2016, DJe 11/03/2016).

Assim, embora contrário ao dispositivo de lei, há de se reconhecer a ausência de eficácia das expressões desse ponto, contidas no plano de recuperação judicial, restringindo a extensão dos efeitos da recuperação judicial aos termos da legislação vigente.

3. Previsão de descumprimento do plano

Na sequência do item 7, precisamente na letra f) há a seguinte previsão:

O plano poderá ser alterado, independentemente do seu descumprimento em AGC convocada para esta finalidade, observados os critérios previstos nos artigos 45 e 58 da LRF deduzidos os pagamentos porventura já realizados na sua forma original. (evento 154, OUT4, Pág. 9/10)

Embora com redação dúbia, há de se esclarecer que o descumprimento do plano enseja na decretação da falência das empresas em recuperação judicial, conforme prevê os artigos 61, §1º, 62 e 73 todos da Lei nº 11.101/2005, os quais se transcreve:

Art. 61, § 1º: Durante o período estabelecido no caput deste artigo, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, nos termos do art. 73 desta Lei.

Art. 62: Após o período previsto no art. 61 desta Lei, no caso de descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano de recuperação judicial, qualquer credor poderá requerer a execução específica ou a falência com base no art. 94 desta Lei.

Art. 73: O juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial:

IV – por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do § 1º do art. 61 desta Lei.

Qualquer previsão contida no plano de recuperação judicial que se mostre em conflito com os dispositivos de lei mencionados, não tem qualquer eficácia. Havendo descumprimento do plano de recuperação judicial, poderá ser decretada a falência independente de qualquer previsão em sentido inverso.

4. Alienação dos ativos

Sobreveio em modificativo de plano (evento 1435) a descrição pormenorizada do procedimento a ser adotado pelas recuperandas na venda de UPI alienado fiduciariamente ao BANRISUL.

Como ambos os imóveis se encontram com gravames, seja por hipoteca, seja por alienação fiduciária, em favor do credor BANRISUL, o credor necessariamente terá que concordar com o plano e modificativo, bem como com a constituição das UPI’s e venda dos imóveis. (evento 1435, OUT2, pág. 3).

Em ata da votação, constou a cessão de crédito realizada em favor de BLACKPARTNERS MIRUNA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS (evento 1610) reconhecida pelo juízo pela decisão de evento 1617, substituindo-se a participação do BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S.A no referido crédito.

Feito isso, votou a BLACKPARTNERS MIRUNA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS (FIDC MIRUNA) favorável ao plano de recuperação judicial, portanto, aderindo ao modificativo que prevê itens que lhes tocam, especificamente.

E ainda, considerando o detalhamento do trâmite previsto para a alienação dos ativos, entendo terem as recuperandas cumprido os requisitos que autorizam o enquadramento na exceção prevista no art. 66 da lei 11.101/2005:

Art. 66. Após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo não circulante, inclusive para os fins previstos no art. 67 desta Lei, salvo mediante autorização do juiz, depois de ouvido o Comitê de Credores, se houver, com exceção daqueles previamente autorizados no plano de recuperação judicial.     (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) 

Tal é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO E ADITIVO APROVADOS EM SEGUNDA CONVOCAÇÃO. HOMOLOGAÇÃO. AGRAVO INTERPOSTO POR CREDOR DETENTOR DE CRÉDITO COM GARANTIA REAL.   CLASSE DE CREDORES COM GARANTIA REAL. DESÁGIO DE 30%, PARCELAMENTO EM 9 PRESTAÇÕES ANUAIS E CORREÇÃO PELA TAXA REFERENCIAL DE JUROS (TR) COM ACRÉSCIMO DE 2,0% DE JUROS AO ANO. DECISÃO ASSEMBLEAR SOBERANA EM TAL ASPECTO, ANTE A LIVRE NEGOCIAÇÃO ENTRE OS CREDORES E AS RECUPERANDAS E A AUSÊNCIA DE ILEGALIDADES, ABUSO OU FRAUDE, HIPÓTESES ESTAS QUE EXCEPCIONALMENTE ENSEJARIAM A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. PRECEDENTES.  (...) DISPOSIÇÃO QUE PREVÊ A VENDA DE ATIVOS EXPRESSAMENTE LISTADOS NO PLANO E PREVIAMENTE AVALIADOS.     A venda de ativos é meio de recuperação judicial e a decisão assemblear é soberana. Daí resulta que, se os credores concordaram com a venda de bens que integraram anexo do aditivo ao plano porque não geram renda e são obsoletos, é porque preferem a venda do que a possibilidade de decretação da quebra. Não se antevê ilegalidade em tal disposição porque tais bens foram previamente avaliados e foram listados em rol disponibilizado no aditivo plano, que veio a ser analisado pelos credores, votado e aprovado.   VENDA DE QUALQUER OUTRO ATIVO AO LIVRE ARBÍTRIO DA RECUPERANDA. ILEGALIDADE.   Disposição no sentido de garantir ao grupo em recuperação a plena gerência de seus ativos, com autorização, com a aprovação do plano, para venda de ativos móveis e imóveis é, de certo modo, vaga e abstrata e, por isso, colide com a disposição do art. 142 da Lei nº 11.101/05 que, para a alienação de ativos, exige prévia oitiva do administrador, do comitê de credores, se existente, e autorização judicial. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4028667-89.2017.8.24.0000, de Criciúma, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 21-03-2019).

O Superior Tribunal de Justiça, em análise a matéria em questão, assim estabeleceu:

RECURSO ESPECIAL. EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ALIENAÇÃO. UNIDADES PRODUTIVAS ISOLADAS. HASTA PÚBLICA. REGRA. OUTRA MODALIDADE. EXCEÇÃO. REQUISITOS. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a definir se a alienação de ativos na forma de unidade produtiva isolada pode se dar por meio diverso do previsto nos artigos 60 e 142 da Lei nº 11.101/2005. 3. A alienação de unidades produtivas isoladas prevista em plano de recuperação judicial aprovado deve, em regra, se dar na forma de alienação por hasta pública, conforme o disposto nos artigos 60 e 142 da Lei nº 11.101/2005. 4. A adoção de outras modalidades de alienação, na forma do artigo 145 da Lei nº 11.101/2005, só pode ser admitida em situações excepcionais, que devem estar explicitamente justificadas na proposta apresentadas aos credores. Nessas hipóteses, as condições do negócio devem estar minuciosamente descritas no plano de recuperação judicial que deve ter votação destacada deste ponto, ser aprovado por maioria substancial dos credores e homologado pelo juiz. 5. No caso dos autos, a venda direta da unidade produtiva isolada foi devidamente justificada, tendo sido obedecidos os demais requisitos que autorizam o afastamento da alienação por hasta pública. 6. Recurso especial não provido. (REsp 1689187/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/05/2020, DJe 11/05/2020).

Os mencionados dispositivos de lei são indicativos da viabilidade da manutenção da referida cláusula no plano de recuperação judicial.

5. Cumprimento ao Art. 57 da lei 11.101/2005

A lei prevê que, com a aprovação do plano de recuperação judicial, as recuperandas apresentem certidões negativas de débito tributário, a fim de viabilizar a sua homologação e conceder a Recuperação judicial efetivamente.

Art. 57: Após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembléia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.

Todavia, em entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça, tal exigência restou sobrestada, em razão da função maior da recuperação judicial: o soerguimento da empresa:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. DESNECESSIDADE. PRECEDENTE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Segundo a jurisprudência da Terceira Turma, a apresentação das certidões negativas de débitos tributários não constitui requisito obrigatório para a concessão da recuperação judicial da empresa devedora ante a incompatibilidade da exigência com a relevância da função social da empresa e o princípio que objetiva sua preservação. Precedente. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1802034/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 03/03/2021).

E ainda: 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONCESSÃO. REGULARIDADE TRIBUTÁRIA. COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. A decisão monocrática que nega seguimento a recurso especial, com base em jurisprudência consolidada desta Corte, encontra previsão nos arts. 932, IV, do CPC/2015 e 255, § 4º, II, do RISTJ, não havendo falar, pois, em nulidade por ofensa à nova sistemática do Código de Processo Civil. Ademais, a interposição do agravo interno, e seu consequente julgamento pelo órgão colegiado, sana eventual nulidade. 2. Consoante jurisprudência pacífica desta Corte, é "desnecessária a comprovação de regularidade tributária, nos termos do art. 57 da Lei 11.101/2005 e do art. 191-A do CTN, diante da inexistência de lei específica a disciplinar o parcelamento da dívida fiscal e previdenciária de empresas em recuperação judicial" (REsp 1.187.404/MT, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/8/2013). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1444675/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2021, DJe 23/04/2021)

Considerando que os créditos tributários não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, há de se reconhecer que o ente público dispõe de meios próprios na busca de seus créditos. Logo, o entendimento firmado pelo STJ, última instância quanto ao tema, torna o dispositivo de lei (art. 57) inaplicável, de modo que autoriza o juízo a homologar o resultado da assembleia geral de credores, independentemente da apresentação das certidões exigidas pela lei 11.101/2005.

6. Remuneração do Sr. administrador judicial

A remuneração do administrador judicial, após a apresentação de proposta e concordância expressa das recuperandas, restou estabelecida de forma provisória na decisão do evento 344 fixando-a no valor mensal de R$ 12.000,00 (doze mil reais), o correspondente a 1,6395% dos créditos submetidos a recuperação judicial (R$ 38.323.790,24), baseado na lista de credores apresentada pelas recuperandas (evento 1, OUT5).

III. Fixo em R$ 12.000,00 (doze mil reais) mensais a remuneração da Administradora Judicial Gladius Consultoria e Gestão Empresarial S/S LTDA, de forma provisória. Determino que o pagamento seja feito diretamente em sua conta bancária, até o dia 05 de cada mês – ou, subsidiariamente, em outra data que seja conveniente para ambas as partes (Recuperandas e Administrador Judicial);

Todavia, com a apresentação da lista de credores pelo administrador judicial, o valor submetido aos efeitos da recuperação judicial reduziu para R$ 23.707.812,19 (edital de evento 203). Já na assembleia geral de credores, somados os créditos trabalhistas, garantia real, quirografários e de ME e EPP, o montante chegou a R$ 25.302.901,38.

De todo modo não há qualquer informação recente de inadimplemento dos honorários do administrador judicial, de modo que se presume cumprida a obrigação, até o momento.

Verifica-se que todos os procedimentos exigidos pelo administrador judicial foram executados com competência e zelo.

Destaco, ainda, que este magistrado não tem por hábito a fixação da remuneração do administrador judicial no teto máximo previsto na Lei em razão dos critérios legais fixados, vale dizer, tento não extrapolar o preço de mercado nem as condições de pagamento por parte das recuperandas. Assim, levando em conta o valor efetivamente submetido a recuperação judicial, qual seja, a soma dos créditos constantes na assembleia geral de credores (R$ 25.302.901,38) entendo coerente a fixação dos honorários do administrador judicial no patamar de 2% (dois por centos), o que totaliza R$ 506.058,03 (quinhentos e seis mil e cinquenta e oito reais e três centavos)

Assim, e ressaltando a qualidade dos trabalhos até desenvolvidos pelo sr. administrador judicial, torno definitiva a fixação dos seus honorários em 2% (dois por cento) sobre o montante do quadro geral de credores aprovado em assembleia geral (evento 1643), que deverão ser pagos na forma fixada na decisão do evento 344, abatidos os valores já pagos.

Por fim, sobreveio, nesta data no momento em que estava concluindo a presente decisão, petição do SINTRATURB, sustentando "ilegalidades do plano de recuperação aprovado", postulando a nulidade da assembleia realizada e o consequente "indeferimento da concessão da recuperação judicial".

Alega, em síntese, que o pagamento dos credores trabalhistas está condicionado à liberação dos valores depositados nos autos da ação ordinária n. 5001616-79.2015.4.04.7200; ilegalidade do procedimento assemblear,  e omissão quanto à instalação do comitê de credores; ausência de certidões de débitos federais e excesso de prazo para suspensão  das ações e execuçoes contra as recuperandas.

Tenho, entretanto, que não assiste razão ao requerente.

Entendo que não há a alegada vinculação do pagamento dos débitos trabalhistas à liberação da importância depositada nos autos 5001616-79.2015.4.04.7200. 

É que embora conste na ata que as recuperandas têm expectativa da liberação daqueles valores para pagamento dos credores trabalhistas, não há no plano vinculação expressa do pagamento àquela liberação, como se vê da reprodução de parte do texto da ata:

Ainda, quanto à proposta de pagamento aos credores trabalhistas, dissertou acerca da expectativa de remessa dos valores que se encontram depositados nos autos nº 5001616-79.2015.4.04.7200, em trâmite na 4ª Vara Federal de Florianópolis, para o processo de recuperação judicial, verba essa que pretendem utilizar para adimplemento da classe trabalhista, por meio de uma única parcela no prazo de até 12 (doze) meses contados da concessão da recuperação judicial.

Como se pode ver, relatou-se apenas uma expectativa de liberação daqueles valores, mas não consta expresamente nenhuma advertência acerca de não eventual liberação pelo júízo daquela execução, de modo que a cláusula de pagamento dos credores trabalhistas em até 1 (um) ano da presente decisão, como consta no plano homologado, atende as disposições do art. 54 da Lei n. 11.101;05, e sua ulterior modifação demandará aprovação dos credores, na forma da lei, pena de convolação em falência. Vale esclarecer, as recuperandas terão que efetuar o pagamento dos débitos trabalhistas no prazo fixado no plano homologado independente da liberação ou não dos valores depositados na ação 5001616-79.2015.4.04.7200, em trâmite na 4ª Vara Federal de Florianópolis.

No que concerce à suposta ilegalidade no procedimento assemblear trata-se de matéria já apreciada anteriormente e que manteve a assembleia designada.

Em relação à suposta omissão da instalação do comitê de credores arguida também na ata assemblear, dela consta igualmente a imediata resposta do presidende daquele ato, da qual destaco

"Ao que respondeu o Presidente, de que foi devidamente apregoado o tema, inclusive em sua sequência cronológica, com as advertências de estilo quanto às responsabilidades e modo de operação. Destacou, mais uma vez o Presidente, que todo o evento é gravado, e estará disponível na plataforma do “Youtube”, para que se possa verificar as alegações aqui postas. Ao final, foi assinada pelo Presidente e demais credores que declararam anuência através do sistema de votação eletrônico, conforme relatório anexo à ata".

Como se vê, após a manifestação do Presidente na própria assembleia o requerente nada mais rebateu, e a petição do evento 1666 não traz nenhuma prova contra a afirmação do Presidente da AGC.

Outrossim, em relação à ausência do certidões negativas de débitos o tema foi apreciado acima.

Por último, a suspensão do curso das ações e execuções contra a falida permanecem enquanto vigorar o stay period, que, no caso presente, foi prorrogado, e finaliza com a homologação por este Juízo do plano de recuperação judicial aprovado pela assembleia geral de credores.

Em asim sendo, rejeito os requerimentos da petição do evento 1666.

 

III. DISPOSITIVO

Ante o exposto:

a) com fundamento no art. 58, caput da Lei nº 11.101/2005, homologo o resultado da assembleia geral de credores e CONCEDO A RECUPERAÇÃO JUDICIAL as empresas BIGUAÇU – TRANSPORTES COLETIVOS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA; GAR - TRANSPORTE COLETIVO EXECUTIVO DE PASSAGEIROS LTDA e GAR PARTICIPAÇÕES LTDA , já qualificadas no feito, nos termos do plano de recuperação judicial do evento 154, seu  modificativo de evento 1435 e aditivo firmado na assembleia geral de credores (evento 1643), com os efeitos prescritos no art. 59, caput e § 1º da Lei nº 11.101/2005, com as seguintes ressalvas:

a.1 os efeitos da recuperação judicial atingem apenas as recuperandas, nos termos do art 49 e 59 da lei 11.101/2005 e Súmula 581 do STJ, sendo ineficaz qualquer disposição em contrário;

a.2) que a consequência legal para o descumprimento do plano é a decretação da quebra, conforme prevê os artigos 61, §1º, 62 e 73 todos da Lei nº 11.101/2005;

b) fixo a remuneração definitiva do administrador judicial em 2% (dois por cento) sobre o montante submetido à recuperação judicial conforme o quadro geral de credores aprovado em assembleia geral, mantendo a forma de pagamento nos termos da decisão do Evento 344;

c) fica ciente a devedora, com a intimação desta sentença, por seus representantes, que permanecerá em recuperação judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até dois anos depois da publicação desta sentença. Durante esse prazo, o descumprimento de qualquer destas obrigações acarretará a convolação da recuperação judicial em falência, nos termos do art. 61 da Lei nº 11.101/2005;

d) mantenho o administrador na condução das empresas requerentes, sob a fiscalização da administradora judicial, nos termos do caput do art. 64 da Lei nº 11.101/2005;

e) Cientifique-se o Ministério Público;

f) Cientifique-se o Sr. Administrador judicial;

No mais:

g) Cancele-se a habilitação de crédito de evento 1631, protocolada em descumprimento aos artigos 7º e 8º da lei 11.101/2005. Intime-se o credor, por seu procurador, para querendo, proceda nos termos do que estabelece o art. 19 do mesmo diploma legal.

h) dê-se vista às recuperandas e sucessivamente ao administrador judicial a respeito da decisão de evento 1651, no prazo de 10 (dez) dias. Vindo as manifestações aos autos, voltem conclusos para deliberação.

i) a determinação encaminhada pelo Superior Tribunal de Justiça de evento 1661 será respondida em evento próprio e após o conhecimento do juízo de todas as informações a serem prestadas.

j) Rejeito os requerimentos da petrição do evento 1666.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Após, aguarde-se em cartório o prazo de 02 (dois) anos previsto no art. 61 da Lei nº 11.101/2005 e os pagamentos na forma definida no plano de recuperação judicial, sob a fiscalização da administradora judicial.



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